Como de costume nesta data, visitei o cemitério com a minha mãe, pus umas flores na campa da minha querida avó e rezei. Continuei o mesmo ritual junto das campas dos pais dos meus amigos, afinal, é uma dor que tenho com quem partilhar, e no meu grupo de amigos somos demasiados e demasido novos para saber o que isso é! Não sei porque põe as pessoas flores nas campas, deve ser para atenuar aquele cenário mórbido de mármore, mas continuei e pus algumas à entrada do jazigo do Alberto. Mal me lembro dele, mas ouço os meus amigos falar dele, principalmente o meu irmão e sinto uma sensação indescrítivel, que não é saudade nem pena mas que me faz lamentá-lo...desta vez fi-lo porque o meu irmão não estava connosco. Antes de ir embora passei pela última morada do Pedro, o "nosso" Sex Machine! Vi as datas e fazia exactamente 4 anos!
Os meus pensamentos transportaram-me à data inscrita na lápide e lembrei-me de ter acordado em Faro com um telefonema da Patrícia completamente histérica e de ter berrado com ela, voltei a adormecer e quando acordei de vez pensei que tivesse tido um pesadelo. Foi porém demasiado real e ao ver o histórico das chamadas do telefone constatei que realmente tinha recebido uma da Patrícia! Tomado de assalto pelo medo liguei à Cláudia cuja voz quase inaudível me confirmou a notícia! Fiquei estupefacto, sem saber o que pensar: "O Sex? Impossível! De mota? Nunca...nem mota tem!" pensava para me tentar convencer do impossível "Ou será que tinha?". Estive assim por um tempo indeterminado, o pessoal da minha casa apercebeu-se do que se tinha passado e disponibilizaram-se para me ajudarem. Mimaram-me durante os tempos em que andei esparveirado e ainda hoje lhes agradeço. Liguei para casa e combinei com a minha mãe que ainda hoje me meto aí. Ao fim de quase 5 horas de Expresso chego ao Redondo e os poucos amigos que vejo lançam-me olhares tristes e pesarosos e interrogam-me: "Já sabes?" "Estavas cá?" "Não, cheguei agora...", respondi eu sem acabar a frase. Começou para mim uma fase a que infelizmente me habituei: funerais de pessoas próximas e amigas: 3 no espaço de um ano. Com 17 anos, é até capaz de ser a altura ideal, se é que há alturas ideais para o inevitável; já não era um puto ainda sem capacidade de compreensão e ainda não era um adulto com a vida feita, esquecido desse espectro com o qual temos de lidar (ou ir lidando) ao longo da vida! Fui beber um café e encontrei uma data de amigos próximos do Sex: o Luís Gabriel, o João Manuel, o Jaime, o Paulo...um deles lembrou uma conversa parva em que ele tinha dito: "Se alguma vez desaparecer de alguma forma parva ou inesperada, não quero que os meus amigos chorem por mim, quero é que se juntem a beber umas loiras lembrarando as maluquices que fizémos." cumprimos metade, não conseguimos controlar as lágrimas. Passámos a noite nisto, à porta da casa funerária, uns a fumarem cigarros, os outros de mãos nos bolsos a suspirar e a tentar aguentar os outros quando mal nos conseguíamos controlar a nós. O ambiente era horrível, os pais e a irmã de preto, a chorarem, os familiares a amigos próximos, tudo mais velho que nós, principalmente aquilo a que chamo "A Claque dos Funerais", aquele grupo de velhas beatas cuja vida social é feita entre a igreja, a casa mortuária e o cemitério. Àquelas mais discretas consigo perdoar, mas as histéricas que mal conseguem disfarçar a falsa fé enojam-me! Lá estava ele, bonito como sempre, mas pálido o "puto" que era mais velho que eu...um autêntico playboy! Na manhã seguinte a minha mãe acordou-me e eu fiquei na cama a chorar, ainda a negar o que se estava a passar depois de uma noite que se torna estúpida mas sinceramente "quase" agradável, dá até vontade de dizer que é preciso morrer alguém para se juntarem os amigos e recordarem histórias e estórias que nos põem um sorriso nos lábios, só essas...as outras depressa são esquecidas e perdoadas quando as pessoas percebem demasiado tarde que o cheque apresentado (a vida) é alto demais para nos ser cobrado por tão poucochinha coisa.
Ouvi a voz da minha mãe atrás de mim e voltei à realidade, apercebo-me de que perdi completamente a compostura, estou lavado em lágrimas e choro compulsivamente mas em silêncio, de óculos escuros, cara molhada, um braço cruzado à altura do peito e a morder os nós dos dedos do outro, quem me visse ao longe poderia até pensar que me estava a rir, encolhendo os ombros e abanando a cabeça. No caminho de regresso ao carro penso talvez que por não ter saído da cama naquela manhã de 1 de Novembro de 2001 ainda hoje viro esquinas à espera de encontrar um gajo pequeno metido no seu blusão de cabedal, bem parecido, com um sorriso reguila e um coração maior que ele, que gostava de Rammstein, com quem jogava nas máquinas ao mesmo tempo que falávamos dos nossos amores e desamores com as raparigas e que era o Pedro Pinheiro aka "Sex Machine" um dos meus melhores amigos que nunca mais vou ver e que lembro com uma eterna saudade que me dá, no entanto, mais força para viver e amar os que me são queridos...