Há
coisas que só a nós dizem respeito. A nós. A mais ninguém. Muitas coisas.
Diversos tipos de coisas. Eu para mim, tenho muitas dessas. Outras pessoas, nem
tanto, pelos vistos. Isto não é uma crítica, apenas uma opinião.
No
passado Sábado desloquei-me ao Espaço Nimas, na Avenida 5 de Outubro para ver a
exibição do filme de uma querida amiga minha sobre um querido personagem da
minha querida terra. É muita coisa querida.
Acabei
por ver um outro que é sobre a perda de alguém querido.
O
filme “Balaou”, de Gonçalo Tocha não é para todos. Para mim já ele não é, não
só por não ser cinéfilo, mas porque (como tive oportunidade de no final
partilhar com o próprio realizador e com os outros presentes na sala) é algo
que eu nunca me atreveria a fazer.
“Balaou”
fala sobre uma das mais medonhas coisas com que a nossa existência nos brinda:
a perda de alguém querido e o correspondente luto.
Ainda
antes de a projecção começar, o realizador dirigiu algumas palavras à plateia
explicando que o filme era uma homenagem à sua falecida mãe, em jeito de carta
que nunca tinha sido escrita, mas filmada e narrada. Logo nesse instante, e ao
mesmo tempo que temia abominar o filme, veio-me à cabeça a palavra “coragem”. É
preciso ter um par de tomates do tamanho do mundo para se falar sobre isso num
filme. Projectar em personagens mais ou menos fictícios, metaforizar, encontrar
associações, estabelecer paralelismos, é uma coisa. O que o Gonçalo fez foi
falar com a sua própria mãe. Arrepiante.
Embora
tenha observado atentamente o filme, não consigo dizer que gostei do mesmo. Mas
também não consigo dizer que não gostei. Só sei que fiquei com uma grande
admiração pelo realizador que segundo nos contou, investiu grande parte do que
herdou após a morte da mãe para realizar este projecto.
A
grande admiração com que fiquei pelo Gonçalo prende-se sobretudo por passados
quase 11 anos da perda do meu pai, não passar um único dia sem que me surja uma
pergunta que gostaria de lhe fazer. E não se trata daquelas lamechices do que
se devia ter falado e não se falou enquanto houve tempo, nada disso. Trata-se
de que hoje vivo permanentemente na dúvida: “O que teria o D. Vicente a dizer
sobre assunto tal, sobre fulano e beltrano?”. Ora eu nunca conseguindo ter
respostas a estas perguntas, o mais que consigo fazer é imaginar-me a
perguntar-lhas. Mais nada. E nunca cometeria a heresia e a presunção (como
outros o fazem) de dizer com ar saudoso: “Ahhhh...se o meu pai fosse vivo diria
isto e faria o outro acerca de tal...” Nada disso. OK, vá, só acerca que
pouquíssimas coisas que, mais que da sua rotina, fariam parte da sua
personalidade. Quanto a certas atitudes, zero. E já agora agradeço que um dia
quando me finar tenham o respeito de não fazer o mesmo exercício, a não ser em
relação aos meus lendários gostos gastronómicos, musicais, taurinos e
clubísticos. Aí, quem me conhece minimamente consegue saber exactamente o que
penso.
Ora
no “Balaou” o realizador e narrador põe-se completamente a nu, a descoberto.
Não tem qualquer pudor em fazer-nos escutar uma conversa íntima com a sua mãe.
Ainda que considere isso um tanto ou quanto invasivo (porque, mais uma vez,
nunca o conseguiria fazer), não posso deixar de pensar que tem que se ter uma
grande necessidade de o fazer, para o fazer.
Quanto
a mim, escrevo. Bem, mal, mais ou menos claro, mais ou menos directo,
simplesmente escrevo. Não filmo, não canto, não danço, não pinto, não rimo.
Escrevo. Nem tudo o que escrevo é para toda a gente ler, é claro. Mas tudo o
que gostaria que lessem, escrevo.
Há
coisas que só a nós nos dizem respeito...
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